Mank é o líder de indicações ao Oscar 2021. Concorrendo em 10 categorias é fácil perceber que o filme agradou a crítica norte americana. No entanto, acredito que é um filme fácil de gostar, mas bem difícil de amar.
O projeto é muito pessoal para o diretor David Fincher, seu pai Jack Fincher, que faleceu em 2003, escreveu o roteiro nos anos 90 e desde então o filme estava engavetado. Foi só agora com a ajuda da Netflix que Fincher conseguiu tirar do papel o ambicioso roteiro em preto e branco sobre a Hollywood dos anos 30.
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Enredo
Entramos nos bastidores e nas polêmicas que envolvem a autoria do roteiro do clássico do cinema Cidadão Kane.
Herman J Mankiewicz (Gary Oldman) é um famoso escritor, em uma ainda jovem indústria do cinema, com amigos influentes, um charme particular e muito jeito com as palavras. Ele é contratado para escrever o roteiro do primeiro filme de Orson Welles, um jovem de apenas 24, que já estava fazendo fama no teatro e rádio antes de chegar a Hollywood.
Mank, como é chamado pelos amigos, é alcoólatra e fica trancado em uma fazenda para escapar das tentações da bebida e escrever o roteiro do filme em 60 dias. Ao longo do filme Fincher traça os paralelos da vida de Mank com o filme Cidadão Kane. A relação mais direta é a amizade do roterista com o magnata dos jornais Louis B Mayer (Arliss Howard) tido como a maior inspiração para o personagem de Charles Foster Kane.
Cidadão Kane
Mas e aí, o que acontece se você nunca assistiu Cidadão Kane? É possível entender e curtir Mank?
A resposta é mais ou menos.
Mesmo sendo um clássico do cinema e considerado por muitos como o melhor filme de todos os tempos, acho que a grande maioria não viu o filme de 1941 Cidadão Kane. Sabendo disso Fincher sustenta Mank como uma obra individual, mas é inegável que se você conhecer o filme que inspirou a obra tudo vai fazer mais sentido e ficar mais interessante.
Os paralelos traçados da vida de Mank com o roteiro que ele escreveu são parte essencial da história. A amizade com o magnata Louis B Mayer e a atriz Marion Davies serviram de inspiração para os personagens de Cidadão Kane Charles Foster Kane e Susan Alexander Kane. É inclusive essa conexão entre os amigos de Mank e o personagens do seu roteiro que convenceu Hollywood que Herman Mankiewicz de fato escreveu Cidadão Kane.
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Isso porque na época os roteiristas eram na maioria das vezes fantasmas e seus nomes não apareciam nos créditos dos filmes. Durante anos se acreditou que Orson Welles era exclusivamente o responsável pelo clássico do cinema.
O que o filme da Netflix defende é o oposto. De acordo com Fincher na verdade foi Mank o dono do roteiro de Cidadão Kane e Welles apenas o diretor e ator.
A verdade é mais complexa que isso. Muitos defendem que embora Mank tenha sim participado da criação do roteiro original , foi Orson Welles que completou a obra, mudando trechos essenciais para a genialidade de Cidadão Kane.
Fato é que se você conhece o filme original de 1941 você vai entender Mank muito melhor. Vai reconhecer as características dos personagens da vida real do escritor com os papeis que ele criou para o cinema. Vai lembrar de falas e situações que acontecem em Cidadão Kane e são reverenciadas em Mank e vai entender as homenagens que Fincher presta ao cinema clássico.
Dito isso, é sim possível ver apenas Mank e curtir. Vamos voltar pra crítica do filme que eu explico.
Crítica
Mank é um filme em preto em branco com uma fotografia linda. Não é fácil iluminar cenas em preto e branco, dar vida aos cenários e Mank faz isso com maestria.
O filme busca homenagear no cinema do passado, mas sem perder a contemporaneidade. Os diálogos e estilos de atuação são bem atuais. Na atuação os destaques vão para o ator Gary Oldman e a atriz Amanda Seyfried. Os dois dão um show de atuação que por sí só já faz o filme valer a pena.
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O filme utiliza muito o recurso de flashbacks, alternando entre o quarto escuro onde Mank escreve o roteiro de Cidadão Kane e os trechos da vida dele que serviram de inspiração para o escritor.
Como a sua relação com mulher, amigos, suas visões políticas e o vício com álcool.
Para ajudar a situar o expectador na narrativa, antes de pular para flashbacks do passado, sempre aparece a data e local que vamos visitar. Diferente de um filme em cores onde é mais claro perceber a passagem de tempo, aqui em esse auxílio foi essencial para compreender a história.
Em geral, acredito que Mank é um filme para amantes do cinema, principalmente do cinema antigo. Um filme que agrada mais a indústria de Hollywood, que ama filmes sobre ela mesmo, e menos o público em geral.
É difícil entrar na história e se conectar com os personagens. Talvez falte contexto histórico para entender a real importância de cada personagem que atravessa a tela de Mank.
De qualquer forma, como eu disse, é fácil gostar de Mank, mas bem difícil amar
Oscar
Mank está indicado nas seguintes categorias no Oscar 2021: Melhor Filme, Melhor Diretor (David Fincher), Melhor Ator (Gary Oldman), Melhor Atriz Coadjuvante (Amanda Seyfried), Melhor Fotografia, Melhor Figurino, Melhor Maquiagem e Cabelo, Melhor Trilha Sonora Original, Melhor Design de Produção e Melhor Som.
Nota 7