Conheça o livro Departamento de Especulação

De uma perspectiva generalista, é difícil entender os rumos que a vida toma às vezes. Há um mistério intrínseco que não nos é revelado senão pelos momentos de reflexão e pura crise existencial. Mas o que pode ser feito tendo em consideração que a vida adulta sempre nos coloca em caminhos cheios de pedras e buracos, e nos resta apenas desviar de todos eles? Sejam estes provenientes de trabalho, família, amor, casamento… É nesse contexto que somos apresentados ao enredo central de Departamento de Especulação.

A obra de Jenny Offil é uma narrativa simples e trágica sobre os percalços do casamento e da parentalidade. Neste livro, a autora traz um desenvolvimento de forma sedutora e identificável ao fazer decisões curiosas sobre a construção da história. A exemplo, em Departamento de Especulação, Offil decide não nomear as personagens, o que acaba por aproximar o leitor da narrativa.

Conheça a história

Antes de qualquer outra coisa, reviravoltas definem a vida da esposa, protagonista do romance de Offil. Ela não quer se casar, mas acaba se apaixonando por um músico, casando e construindo uma família. A esposa retoma vários momentos de sua vida, do antes até a forma como seu relacionamento passa a desandar.

“As pessoas são bem intencionadas. É nisso que ele acredita. Então como ele é casado comigo? Eu odeio com facilidade e frequência. […] Você é crítica demais, minha psiquiatra diz, e eu choro até chegar em casa pensando nisso.”
departamento de especulação

Neste contexto, a autora traça caminhos interessantes ao trabalhar o ponto de vista desta mulher ao ver as mudanças de sua vida e ao reprimir suas idealizações em algo que é esperado de um casamento tradicional. Ela é uma esposa, uma mãe, uma mulher. E aqui cabe também um paralelo ao estudo feito pela Profa. Dra. Monica Figueiredo sobre as personagens de Eça de Queiroz. Em seu livro, ela trata de como os espaços corpo, casa e cidade (que, não por acaso, são o título de sua obra) funcionam como base da limitação feminina. Estes espaços fazem parte do universo de conhecimento e domínio da mulher. Já que é ela que fica em casa, enquanto o marido sai para conhecer o mundo (isto ainda sobre as obras de Eça).

Mas como é possível trazer isso para a obra de Offil?

Assim como na sociedade real em que vivemos, Departamento de Especulação nos mostra como essa protagonista feminina acaba sendo resumida ao seu ambiente familiar. Ela deixa sua vida para trás para se enquadrar nesta rotina de casamento, e em como isso repercute não apenas na forma como ela se enxerga, mas também como enxerga o mundo a sua volta. E é neste ponto que a história encontra a perspectiva de Figueiredo.

E ainda…

Para além do enredo, é necessário prestar atenção no formato em que o livro é escrito. Em uma série de cartas, as personagens contam sua história como um projeto de comunicação diferente. Primeiro, conhecemos a Esposa, mas à medida que a obra se aprofunda, conhecemos também o Marido. A decisão de referir-se a eles apenas por títulos já merece destaque, já que nos envolve diretamente no universo matrimonial. O leitor é diretamente colocado nesta redoma que envolve a relação dos dois. E é por isso que existe a aproximação entre o texto lido e quem está lendo.

Além disso, a contrução a partir de pequenas cartas torna mais fácil de engolir as trocas de perspectiva, nenhuma delas é seca, todas são interessantes e impactantes de algum modo. Análogo a isto, o formato espistolar dá maior liberdade à autora em explorar sentimentos mais profundos das personagens, afinal, são elas que estão desaguando seus pensamentos em palavras.

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