Desafiante e arrebatador, O Crime do Bom Nazista é um quebra-cabeça que retoma a literatura policial clássica.
Passados quase oitenta anos do fim da Segunda Guerra Mundial e, por consequência, o Holocausto, ainda se faz um dever importantíssimo o combate ao antissemitismo que parece espreitar a nossa sociedade. De fato, uma onda ultradireitista vem se espalhado nos últimos anos. Em consequência disto, vemos não só um preconceito claro contra as populações semitas, como também a populações diversas, como pessoas de diferentes grupos etnicos, gêneros e sexualidades. Coisas intrínsecas a nosso contexto social como um todo. E a literatura tende a refletir estes aspectos.
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Aos amantes de ficção, o livro de Samir Machado de Machado constrói um clima de mistério ao se utilizar de um pano de fundo histórico. É, de fato, interessante como a literatura de ficção que se citua em tempos passados consegue cruzar com fatos históricos sem que precise deturpa-los. E é nesse contexto que a obra de Machado se desenvole. A história toma forma no início da década de 30, quando um zepelim atraca na cidade de Recife, trazendo passageiros diversos. No entanto, durante a noite, acontece um assassinato, e cabe ao policial a bordo encontrar o assassino.
Da História
A começar, Samir Machado de Machado tem uma notável abilidade em demonstrar através paralelismos o status da sociedade brasileira da década de 30. Afinal, o Brasil nem passava por perto da ilusão de diversidade pacífica que muitas vezes era ilustrada para o exterior. Um exemplo disso, é representação do Congresso Brasileiro de Eugenia no livro, em que o médico eugenista Vögler seria palestrante. Este congresso foi um evento real, que ocorreu no ano de 1929 em São Paulo. Assim, a referencia exprime a natureza racista até mesmo da medicina da época, já que não era incomum que médicos brasileiros considerassem o método eugênico uma saída real para o “problema” da raça no Brasil. Afinal, foi uma linha teórica que ganhou bastante força no país, e apoiada figuras conhecidas como o próprio Moteiro Lobato.
É neste pano de fundo social que Machado desenvolve um esquema investigativo, mas o que, de fato, mais chama a atenção é o uso de figuras de linguagem no empreendimento do enredo. A história é construída a partir de uma narrativa retórica, que acredito ser a parte mais interessante da constituíção técnica do texto.
Ao que concerne o tratamento dos personagens pela narrativa, O Crime do Bom Nazista entrega caracteres peculiares, diversificados. É claro que, como são todos suspeitos de um crime, nenhum deles pode ser considerado confiável. Mas certamente compartilham características interessantes em relação a seus traços de personalidade.
Enfim, vale a pena?
Seriam um crime não exaltar a complexidade e a potência dos links entre o que acontecia na Europa em 1933 e as dicotomias da sociedade brasileira da época. Este é, factualmente, o charme da história. Mas isto apenas faz com que O Crime do Bom Nazista ser um livro excepcional? Em partes, sim. Todavia, é invegável que a áurea misteriosa nos leva a pensar no estilo de romance policial como os clássicos de Aghata Christie, e isso pode até classicicá-lo como algo mais palatável. Entretanto, o autor tende a se demorar em momentos não tão importantes que podem tornar a leitura massante, considerando que o livro tem pouco mais de 100 páginas.
E, até contrariando um pouco o que foi dito anteriormente, existe um problema de balanceamento entre a contextualização histórica e o mistério de fato, que deveria, quem sabe, ser o plano principal da narrativa. Isto obviamente não tira pontos de O Crime do Bom Nazista de uma perspectiva literária, mas é uma questão a ser considerada no momento da leitura. Então, certamente indicamos este livro como uma boa leitura de inverno.
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Ficha Técnica
Título: O Crime do Bom Nazista
Autoria: Samir Machado de Machado
Editora: Todavia
Nº de Páginas: 128