Em ‘Monster’, Hirokazu Kore-eda retrata o peso da tradição cultural, e o quanto ela pode nos sufocar

Em ‘Monster’, Hirokazu Kore-eda retrata o peso da tradição cultural, e o quanto ela pode nos sufocar

Se existe uma sociedade, onde o peso da tradição cultural, o individualismo, e desafeto, essa sociedade é a japonesa. É tendo esta visão, que o diretor Hirokazu Kore-eda constrói a narrativa de seu mais novo filme, ‘Monster’. Vencedor na categoria Melhor Roteiro em Cannes no ano passado, o longa, uma mistura de drama e suspense, nos conta por meio de três pontos de vista, esse retratao de uma sociedade que esconde quase que por completo, seus sentimentos.

A narrativa de ‘Monster’ lembra muito a de Rashomon (1950), de Akira Kurosawa. O longa de 1950 tenha talvez a construção, vista por pontos de vista diferentes, mais emblemática do cinema. E o filme de Kore-eda faz isso de forma exemplar. Primeiro longa que o diretor fica apenas na cadeira de direção desde ‘A Luz da Ilusão’, isso talvez eleve o grau de qualidade do filme.

Para quem já tem conhecimento da filmografia do diretor, sabe que Kore-eda, vencedor da Palma de Ouro em 2018 por ‘Assunto de Família’, costuma colocar em seus filmes questões de profunda reflexão, e sempre tocar em temas sensíveis. E tudo isso, elucidando a infância como alicerce de análise.

No filme, quando Minato (Soya Kurokawa) começa a se comportar de maneira estranha, sua mãe, Saori (Sakura Ando) sente que há algo errado. Ao descobrir que o responsável é o professor Hori (Eita Nagayama), ela invade a escola exigindo saber o que está acontecendo. Mas à medida que a história se desenrola através dos olhos da mãe, da professora e da criança, a verdade emerge gradualmente.

Koro-eda conta sua história através de três perspectivas, algo que o roteirista Yûji Sakamoto desenvolve e amarra com primor. É a partir desta abordagem, que a montagem do filme estabelece uma linha temporal, contando a versão dos fatos dos três envolvidos. E a cada ato do longa, Koro-eda expande sua abordagem, e começa a contar seu drama de forma intimista e única, pois como dito na introdução do texto, o Japão é um país que leve a tradiçao ao último grau. Ou seja, ‘Monster’ fala sobre esse peso cultural, aqui o de espremer seus sentimentos consigo mesmo, e sob o viés das três perspectivas, o diretor responde alguma ponta, e faz o público pensar numa nova ideia a cada uma dessas versões.

O filme inteiro busca trabalhar e trazer para debate, essa repressão que existe no Japão (aqui pode ser encarada como vivída em vários lares urbanos do mundo), sobre os sentimentos de cada um. ‘Monster’ é mais sobre se expressar, sem sofrer algum tipo de repreensão, e se conectar com outro ser humano.

E além de tudo, o filme vem a calhar no exato momento em que, o mundo passa por um processo de individualização extremo. As pessoas estão mais frias, mais tristes, menos sociáveis. E o diretor traz este elemento para seu filme, mas sob o olhar de duas crianças. Kore-eda percebe que, de um jeito ou de outro, será a geração seguinte que sempre sofrerá com esta proteção exarcebada da tradição rústica.

E com a trilha do excelente Ryuichi Sakamoto, este em seu último projeto antes de falecer no ano passado, ‘Monster’ explora a percepção da verdade, sob como a falta de algum tipo de empatia, pode elevar uma situação simples. E um estudo da sociedade japonesa como um todo, e um bravo exercício de perceber essa teatralidade da sociedade para esconder sentimentos.

As perfomances dos jovens Soya Kurokawa e Hinataare Hiiragi são a beleza do filme. O tradicional olhar infântil que o diretor coloca em seus filmes, aqui encontra seu auge. ‘Monster’ é um plano de fundo de uma sociedade que ainda não sabe lidar com escolhar, e muito menos, com a quebra de valores.

Trailer do filme

Avaliação: 4 de 5.

Ficha Técnica

Direção: Hirokazu Kore-eda
Roteiro: Yûji Sakamoto
Duração: 121 minutos
País: Japão
Gênero: Drama
Ano: 2023

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